É errado tratar seu pet como um filho? Especialistas respondem
Ele tem roupinhas, coleira personalizada, um canto especial no sofá e ganha mais fotos no seu feed do que qualquer pessoa da sua família. Tem pet que atende bem esses quesitos.
Ele te espera na porta, sente quando você está triste e é o seu motivo para levantar da cama nos dias difíceis. Mas… será que tratar um animal de estimação como filho é realmente saudável?
A discussão vem ganhando força nas redes sociais, nos consultórios de psicologia e até nas mesas de bar. Afinal, em um mundo cada vez mais solitário, onde o afeto é escasso e os vínculos humanos muitas vezes são frágeis, é errado depositar tanto amor — e expectativa — em um pet?
A resposta pode parecer simples, mas envolve muito mais do que um “sim” ou “não”. E o que está em jogo vai além da sua relação com o animal: pode revelar muito sobre sua saúde emocional, sua forma de amar e até sobre os vazios que você tenta preencher.

Amor demais ou apego perigoso? Onde está o limite
Não há dúvidas: os animais de estimação podem ser grandes aliados na jornada da saúde mental. Eles reduzem o estresse, aliviam a ansiedade e promovem uma sensação de companhia, sobretudo em tempos de isolamento. Mas, segundo especialistas, o excesso de humanização pode ser um problema.
Quando o tutor começa a atribuir sentimentos e comportamentos humanos ao pet, esperando que ele retribua afeto, entenda comandos como uma criança ou se comporte como parte da família em tempo integral, a relação pode se tornar disfuncional.
E mais: isso pode indicar uma fuga emocional, uma tentativa inconsciente de substituir relações humanas por vínculos mais previsíveis e controláveis.
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Segundo psicólogos consultados por instituições como o Conselho Federal de Psicologia (CFP), é comum que esse tipo de comportamento esteja ligado a carências profundas, como o desejo de ter filhos, o medo de se relacionar ou traumas familiares não resolvidos.
Mas esse vínculo exagerado, ainda que bem-intencionado, pode gerar consequências sérias para o animal e para o tutor.
Quando o afeto se transforma em dependência com o pet
Sim, é possível dormir com seu pet, levá-lo para passear no shopping ou preparar uma comidinha especial. Mas há uma diferença entre cuidar e projetar expectativas humanas sobre um animal. Eles têm instintos, limites e necessidades muito diferentes das nossas — e isso precisa ser respeitado.
Muitos tutores acabam adotando mais animais do que conseguem cuidar, acreditando que isso preenche um vazio.
O problema é que, sem estrutura adequada, esse comportamento pode ser classificado como acúmulo compulsivo de animais — algo que traz prejuízos para todos os envolvidos e pode até ser enquadrado como maus-tratos, mesmo que a intenção tenha sido de amor.
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Outro sinal de alerta é quando a presença do pet se torna indispensável para qualquer atividade cotidiana, inclusive dormir, sair de casa ou socializar. O que era uma relação saudável pode se transformar em dependência emocional, exigindo, inclusive, intervenção terapêutica profissional.
O animal, por sua vez, também pode sofrer. Pets superprotegidos, que não têm rotina ou espaço para agir como animais, podem desenvolver comportamentos ansiosos, agressivos ou até adoecer pela falta de estímulos naturais.
Como manter uma relação equilibrada com seu pet
A chave para uma convivência saudável é o respeito à natureza do animal — e o cuidado com os próprios sentimentos.
Segundo a especialista Nathália Leal, psicóloga e terapeuta comportamental, é fundamental:
- Estabelecer regras claras de convivência: nem tudo precisa ser permitido.
- Ensinar crianças a respeitar o pet como ser vivo, não como brinquedo ou boneco.
- Promover a autonomia do animal, evitando torná-lo dependente da sua presença constante.
- Buscar ajuda psicológica, caso perceba que a relação está se tornando uma fuga emocional.
Dormir com o pet? Pode. Comprar roupinhas? Claro. Festejar o aniversário? Por que não? Mas sem perder de vista que ele é um animal — e não uma criança substituta.
Seu pet merece amor — mas você também
O amor pelos animais é algo nobre, bonito e necessário em um mundo cada vez mais hostil. Mas, às vezes, é preciso olhar para dentro e entender por que você escolheu amar tanto — e de que forma.
Tratar um pet como parte da família é legítimo. Mas se ele virou a única fonte de afeto, apoio e propósito, talvez seja hora de olhar para outras áreas da sua vida que estão carentes de atenção.
Afinal, seu cachorro pode ser seu companheiro fiel, e seu gato pode ronronar só para você. Mas nenhum deles pode — ou deve — ocupar o lugar de todas as suas relações humanas. E isso não é falta de amor: é responsabilidade.