Reconhecimento facial NÃO é seguro? O perigo que ninguém te contou
De 2014 para cá, o Brasil passou a adotar cada vez mais tecnologias de vigilância digital. Desde a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, o reconhecimento facial deixou de ser um recurso futurista e se tornou parte do cotidiano em muitas cidades brasileiras.
Mas, apesar do avanço tecnológico, uma questão central ainda preocupa especialistas: a falta de regulamentação. O crescimento acelerado dessa tecnologia aconteceu sem que o país desenvolvesse mecanismos de controle claros e eficazes para garantir a proteção dos direitos dos cidadãos.
É o que revela um estudo recente divulgado pela Defensoria Pública da União (DPU) em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), que alerta para os riscos reais por trás do uso descontrolado dessas ferramentas.

Vigilância em massa e riscos invisíveis
Atualmente, o Brasil conta com ao menos 376 projetos de reconhecimento facial em funcionamento, alcançando cerca de 83 milhões de pessoas — ou seja, quase 40% da população já está, de alguma forma, sendo monitorada por câmeras inteligentes.
Foram mais de R$ 160 milhões investidos em iniciativas públicas que utilizam essa tecnologia, muitas vezes com o objetivo de localizar criminosos foragidos ou encontrar pessoas desaparecidas. Em teoria, a proposta é nobre — mas, na prática, falta transparência e critérios claros.
O grande problema é que não existe uma lei nacional específica que regulamente o uso dessas ferramentas. Sem regras, cresce o risco de abusos, como erros na identificação, invasões de privacidade e até prisões indevidas com base em dados incorretos.
A ausência de controle externo e auditorias independentes também preocupa. Em muitos casos, a sociedade sequer sabe onde, como e por que está sendo vigiada. E quando se fala em tecnologias com potencial para restringir liberdades, o debate precisa ser público e urgente.
Reconhecimento facial e o viés racial
O estudo da DPU e do CESeC traz um dado alarmante: os sistemas de reconhecimento facial apresentam taxas de erro muito mais altas ao identificar pessoas negras, indígenas e asiáticas, em comparação com pessoas brancas.
Esse viés tecnológico não é novidade em outros países, mas agora também é uma realidade brasileira. Em uma sociedade marcada por desigualdades raciais, a adoção de uma tecnologia que amplifica essas distorções é um risco que não pode ser ignorado.
Na prática, isso significa que uma pessoa negra tem mais chance de ser abordada ou até detida por engano, apenas por conta de um erro de sistema. E, mesmo que a correção aconteça depois, o dano emocional e social já foi causado.
O reconhecimento facial, quando mal implementado, não apenas falha como ferramenta de segurança, mas também pode reforçar preconceitos estruturais. É por isso que especialistas defendem que o debate sobre seu uso precisa considerar também o impacto sobre os grupos mais vulneráveis.
O que falta para o Brasil criar uma legislação eficaz
Para reverter esse cenário preocupante, o relatório sugere medidas claras: o Brasil precisa, com urgência, de uma legislação que defina regras e limites para o uso de tecnologias de reconhecimento facial no setor público e privado.
Entre as propostas estão a criação de protocolos técnicos padronizados, auditorias independentes frequentes, e maior transparência sobre onde os sistemas estão sendo utilizados e com quais objetivos. O cidadão tem o direito de saber quando está sendo vigiado.
Além disso, é fundamental intensificar a fiscalização sobre as empresas que fornecem essas tecnologias. Muitas operam sem supervisão adequada, o que amplia o risco de erros, vazamentos de dados e violações à privacidade.
Por fim, o envolvimento da sociedade civil é apontado como um passo essencial. Mais do que uma discussão técnica, essa é uma questão de direitos. O uso da tecnologia deve servir ao bem comum, e não ser mais um instrumento de desigualdade ou exclusão.